Quem me acompanha no Twitter, ou estava na última reunião do .Net Architects, sabia que na semana passada estaria em Redmond, em trabalho junto com a Microsoft. Pois é, fui, trabalhei, e voltei, pra contar pra vocês como é estar dentro da matriz da maior empresa de software do mundo, por uma semana. (Foi por isso que eu passei a semana passada sem escrever aqui.)
Infelizmente não vou poder dar detalhes do que fui fazer lá. Assinei um NDA (Non Disclosure Agreement – mais um) onde todo o trabalho feito por lá está sob confidencialidade. Mas posso contar minhas impressões sobre o local, as pessoas e todo o resto.
Cheguei lá no domingo passado, desci no aeroporto de Seattle, que é a maior cidade do estado de Washington. Redmond fica pertinho, e é bem menor do que eu pensava (como vocês podem ver no mapa). É mais perto do Canadá do que da Califórnia, e é uma típica cidade americana, que me lembrou muito o estado onde morei anos atrás, Connecticut. Casas amplas, jardins, ruas pouco congestionadas, pessoas simpáticas, mas com aquela costumeira distância estadunidense. O tempo estava ruim, e ficou ruim até eu ir embora, já que ele estão no outono, o que já é bem mais frio que nosso inverno. Chovia todos os dias aquela chuvinha chata, e a temperatura estava por volta dos 5ºC. Frio.
Segunda fui trabalhar. Junto a mim haviam outros experts (eles nos chamavam assim: experts). Eram profissionais extremamente importantes nas comunidades em que atuam, alguns escreveram livros muito conhecidos, outros cuidam de podcasts igualmente difundidos e outros ainda palestram em eventos por todo o Estados Unidos. Alguns deles eram ex funcionários da Microsoft, e, descobri depois, voltariam a hora que quisessem, tamanha a proximidade que mantém com a empresa. Foi uma surpresa agradável passar uma semana trabalhando lado a lado dessa diversidade e profundidade de conhecimento.
Logo na manhã do primeiro dia percebi uma coisa: a Microsoft cuida de você. Tudo estava à nossa disposição, incluindo transporte, comida, internet, etc. Parávamos algumas vezes durante o dia para tomar café, e até passei uma situação engraçada. Estávamos pegando algo para comer, e peguei um refrigerante, levei para pagar e… era de graça. Quase tudo que você bebe na Microsoft é de graça, café, chá, refrigerante, suco, etc, etc. E os caras bebem refrigerante e café o tempo inteiro. Não é à toa que americano é gordo, bebendo coca cola o dia inteiro daquele jeito. Além disso, essas pausas para o café eram extremamente generosas, e sempre voltávamos com um monte de comida para a sala, e todo mundo mastigava quase o tempo todo. É claro que entrei na onda, e me fingi de americano. Ganhei 2 quilos.
O trabalho em si foi muito divertido e interessante. Estar ao lado de pessoas com um conhecimento absurdo sobre um assunto (e sendo eu uma delas) foi algo realmente singular. Acho que nunca tinha visto reunido antes tanto conhecimento, de tamanha qualidade, focado em um único propósito por tanto tempo. O feedback dado pela Microsoft sobre o trabalho que realizamos também foi muito positivo, e devo voltar lá mais algumas vezes para mais trabalho, vamos ver.
Ao longo da semana tive alguns momentos de sorte. Um deles foi quando a program manager do Entity Framework, a Elisa Flasko, passou para falar com o time que eu fazia parte. Ela falou um pouco do ADO, EF, Data Services, etc, a ponto de eu ficar em dúvida se ela é PM do EF, ou de todo o ADO, ou de mais pedaços. Enfim, ela se apresentou e terminou com “Podem perguntar o que quiserem”. É claro que eu não ia perder uma oportunidade dessa, todo mundo sabe que eu tenho minhas críticas ao EF 3.5, então joguei muitas perguntas. As respostas dela às minhas perguntas e às dos outros foram ótimas, nada ficou no ar, nada ela disse que não iria poder responder, afinal, estávamos todos sob NDA, então… O que eu posso dizer aqui deste encontro é que estão acontecendo muitas coisas em torno do EF, o time é grande e está dedicado a transformá-lo no ORM de fato da plataforma .Net, algo que, se vocês já olharam o Beta 2 do Visual Studio 2010, está de fato acontecendo. Eles conhecem muito bem as deficiências do EF, e sabem como resolvê-las e onde querem chegar. Percebi que parece haver um intercâmbio da Microsoft com os desenvolvedores de outros ORMs, assim como de outras empresas que fazem provedores para o EF. Foi muito legal ter visto o EF sendo tratado com aquele pé no chão. Meu feeling depois da reunião é de que é questão de tempo para o EF se tornar de fato o que pretende ser: o melhor ORM do mercado para .Net. Os caras não estão para brincadeira.
Tive também a oportunidade de participar de uma reunião de grupo de usuários que aconteceu dentro da própria Microsoft. Fui convidado a participar, assisti uma palestra de VS 2010 dada por um dos program managers do Visual Studio, o Doug Seven. Foi legal ver um dos caras que faz o produto falando sobre ele para uma comunidade de umas 25 pessoas. Ele apresentou as novas versões do VS 2010, falou que agora era a melhor hora de fazer uma assinatura MSDN, porque vão acontecer uns upgrades que vão valer muito a pena. E confirmou que o nome “Team System” morreu, nas palavras dele: “The words ‘Team System’ are gone”. Logo depois um outro palestrante apresentou TDD com .Net, mas não falou quase nada de TDD, conforme eu e outras pessoas concluímos. Um senhor que assistia a apresentação disse que TDD era um nome novo para algo que ele já fazia desde 1972, onde ele disse que praticava TDD nessa época com Mainframes (yeah, right!). É muito comum que existam desenvolvedores mais velhos nos Estados Unidos, algo que ainda temos que alcançar no Brasil. Uma grande parte do grupo era formada por cabeças brancas, que se enturmavam e discutiam com os outros normalmente, entre uma pizza e outra (comida com a mão, claro).
Outro fato interessante foi ter almoçado com o program manager do IronPython. Esse sim disse que não podia nos contar muita coisa, porque era tudo confidencial. Mas deu sua perspectiva sobre vários assuntos do mundo de .Net, o que foi legal também.
Fui a um pub no outro dia com um dos autores do Windows Movie Maker, entre outros produtos. Além disso, bati um papo com alguns desenvolvedores do Windows nessas indas e vindas ao café e ao almoço.
Outro dia fomos passear pelos prédios da Microsoft. São dezenas de prédios em Redmond, um do lado do outro. Na rua você vê carros e ônibus (como esse) que levam os funcionários de um prédio a outro, tudo de graça, e com carros híbridos, ecologicamente responsáveis. Se um ônibus não estiver disponível, você liga e chama um carro pra te levar. Os estacionamentos estão lotados, e tudo é gratuito. Fui à Microsoft Store, que fica numa área mais central. Lá você vê centenas de pessoas caminhando, e o ambiente é mesmo o de uma universidade, daí o local ser conhecido como “Microsoft Campus”:
Na loja, os funcionários pagam um quinto mais ou menos pelos produtos. Comprei um jogo de XBox por 10 dólares. Um XBox Elite saia por meros 250 dólares, e aquele conjunto de direção e pedal, por 80 (aquele mesmo, que aqui no Brasil custa uns 700 reais).
Percebe-se que na Microsoft o clima de trabalho é bem tranquilo. Vejam a janela de uma sala:
“You are entering a world of pain”
Talvez fosse porque era sexta-feira, e à noite era Halloween, mas mesmo assim, “Você está entrando em um mundo de dor” não é algo que você espera ver na janela de uma empresa de software, não é?
Acho que o que fica pra mim desta viagem é que, mesmo já gostando da maneira da Microsoft de trabalhar, ver isso tudo acontecendo de perto é algo muito diferente. Conversar com as pessoas que fazem os produtos é uma experiência incrível. E você percebe que a empresa é muito maior do que você imaginava. Não é a toa que lideram o mundo em investimento em pesquisa e desenvolvimento e em software. Nos diversos e frequentes contatos que tenho com a Microsoft Brasil, não tinha tido até este momento essa visão, talvez porque tão pouco desenvolvimento é feito por aqui, e é até injusto comparar os tamanhos da matriz, e da filial brasileira. Saio desta semana com uma visão bem diferente, e ainda melhor, da que tinha sobre a Microsoft.
Retorno a Redmond em 3 meses, em fevereiro do ano que vem para o MVP Summit 2010. A passagem já está comprada. Antes disso vou rever as pessoas que conheci nesta semana no PDC, daqui a 3 semanas. E claro, vou blogar sobre o PDC, então, se você não for, e quiser saber como está sendo, serei uma das fontes de notícia. E se você for, me dá um toque, nos vemos por lá.
Giovanni Bassi
Arquiteto e desenvolvedor, agilista, escalador, provocador. É fundador e CSA da Lambda3. Programa porque gosta. Acredita que pessoas autogerenciadas funcionam melhor e por acreditar que heterarquia é mais eficiente que hierarquia. Foi reconhecido Microsoft MVP há mais de dez anos, dos mais de vinte que atua no mercado. Já palestrou sobre .NET, Rust, microsserviços, JavaScript, TypeScript, Ruby, Node.js, Frontend e Backend, Agile, etc, no Brasil, e no exterior. Liderou grupos de usuários em assuntos como arquitetura de software, Docker, e .NET.